Você provavelmente deve ter percebido que o clima anda um tanto diferente. Pleno inverno, o país está cada vez mais se encontrando em temperaturas mais altas e em frio excessivo, tudo na mesma estação e em regiões diferentes.
Esse tipo de mudança climática não ocorre apenas no Brasil, mas no mundo inteiro, e isso tem atrapalhado a produção de vinhos (entre outras coisas).
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Um artigo da Bloomberg uniu dados e entrevistas para tratar sobre como o clima tem afetado as vinícolas da Europa, que vêm sofrendo com o calor intenso e os incêndios que assolam a região.
Em 7 de julho, um incêndio florestal consumiu o vinhedo da Quinta da Alegria, de Oscar Quevedo, em Portugal. No meio da madrugada, chamas cercavam o vinhedo, e cerca de um hectare de videiras queimaram. Quevedo, de 39 anos, disse que “nunca havia visto um incêndio tão grande e rápido no coração do Douro”.
Em toda Europa, as temperaturas nas regiões dos vinhedos estão batendo recordes de alta e as ondas de calor estão indo para o norte, para países normalmente mais frios, como a Alemanha. No Reino Unido, temperaturas acima de 40ºC foram registradas pela primeira vez na história. Os vinicultores se preocupam que isto irá reduzir os rendimentos em 25% ou mais para esta safra. Muitos já foram afetados pela geada e pelo granizo. As ondas de calor cada vez mais intensas estão sinalizando que as condições podem ficar ainda mais extremas e imprevisíveis com o tempo.
A mistura de altas temperaturas, seca e rajadas de ventos facilita a disseminação de incêndios e dificulta a extinção. A temporada de incêndios na Europa chegou mais cedo que o normal este ano.
Mesmo que um incêndio não chegue a queimar as videiras, a fumaça das chamas próximas pode arruinar quilômetros de plantações. Quando a fumaça pesada paira sobre as videiras durante dias, ela pode causar manchas de fumaça nas uvas, o que dá aos vinhos um sabor de cinzas. No passado, esse fenômeno afetou os vinhos em Napa e Sonoma, na Califórnia e na Austrália.
Incêndios rurais estão afetando apenas algumas áreas, mas todos os vinhedos estão sofrendo com o calor e a seca extremos. Altas temperaturas persistentes podem queimar as uvas, que não vão amadurecer corretamente, e causar estresse hídrico, impedindo que videiras tenham água o suficiente para florescer.
Sua reação é acumular açúcar mais lentamente, atrasando o amadurecimento e a colheita. As uvas ficam menores e o rendimento cai, afetando a qualidade.
Amantes de vinho também devem saber que cada tipo de uva, exige um tipo específico de clima para ser cultivada. A longo prazo, talvez isso atrapalhe ainda mais na produção de certas castas, fazendo com que nós percamos completamente uma ou outra.
Efeitos na produção francesa de vinho
Dois incêndios começaram por volta de 12 de julho, um perto de Arcachon e outro ao sul de Bordeaux, perto dos vinhedos na região de Graves. Um forte incêndio passou tão perto do pequeno vinhedo Liber Pater que a polícia ordenou sua evacuação dia 18 de julho.
Cerca de 20,9 mil hectares de floresta arderam e milhares de pessoas foram evacuadas.
A boa notícia é que nenhuma videira queimou e a fumaça parece estar soprando para longe dos vinhedos, segundo Cecile Ha, da CIVB, a associação do comércio de vinho. Ainda assim, a previsão do tempo é de temperaturas muito altas próximos dias.
A agroflorestação pode ajudar no calor excessivo. O pioneiro de Bordeaux Château Haut-Bages Liberal em Pauillac plantou árvores nos vinhedos para fazer sombra, resfriar o ar e criar umidade.
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Portugal e Espanha sofrem com os incêndios
Os incêndios são uma ameaça para todas regiões de Portugal. Nenhum vinhedo queimado foi oficialmente relatado, embora o site da ANEPC tenha registrado dezenas de incêndios ativos durante os últimos 10 dias.
O Vale do Ouro, região famosa pelo vinho do Porto, tem tido um calor brutal, com temperaturas atingindo 47ºC. São as mais quentes desde 1941 e boa parte do país sofre com uma seca severa.
Já os mapas meteorológicos na Espanha estão completamente vermelhos, indicando temperaturas extremas em todos lugares. As ondas de calor estão piorando na região. O que antes duravam três dias, agora são de sete a dez. Em algumas propriedades, a irrigação por gotejamento acaba sendo fundamental.
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Itália é afetada pela seca
No início de julho, o governo italiano declarou greve de emergência de seca em várias regiões do norte, incluindo Piemonte, famosa pelo vinho Barolo, e Friuli, no extremo nordeste. Os principais dados são 50% menos chuva do que o normal e três vezes mais incêndios que em um ano médio.
Antonio Capaldo, presidente da Feudi di San Gregorio na Campania, estima que a queda nos rendimentos será de 25% no sul da Itália.
Ninguém quer prever como o clima extremo afetará os vinhos. Produtoras de vinho esperam que o clima melhore, ao mesmo tempo que precisam inovar para resolver esse problema nas próprias produções. Ainda assim, cada vez mais se reconhece que cada ano traz desafios maiores. “Há um limite no que nossos vinhedos conseguem suportar”, diz pioneira em sustentabilidade Torres, da Espanha, pedindo a todos que “por favor, migremos dos combustíveis fósseis para energias renováveis e mudemos nosso estilo de vida”. Dessa forma, o vinho – e o planeta – poderá ter um futuro mais promissor.