As mudanças climáticas estão atrapalhando a produção dos vinhos. Os produtores estão preocupados e tiveram uma ideia para buscar a ‘uva perfeita’ para enfrentar esse problema. Essa busca trata-se de encontrar variedades quase extintas, que são mais resistentes às temperaturas altas, seca e chuvas fortes.
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Amantes de um bom vinho já devem ter provado variedades de uvas bem conhecidas, como Cabernet Sauvignon, Chardonnay, Pinot Noir ou Sauvignon Blanc. No futuro, porém, talvez encontrem uvas de nomes menos familiares: Counoise, Vaccarèse, Mencía, Picpoul Blanc e Cabernet Pfeffer.
Vinicultores da Califórnia e do Texas, nos Estados Unidos, e em países da Europa e da América do Sul estão começando a plantar ou “ressuscitar” essas variedades pouco conhecidas, às vezes quase extintas. Parte de seu objetivo é salvar a herança vitícola mundial.
Mas a maior razão pela qual eles estão defendendo o plantio dessas uvas é porque elas podem se sair melhor em um clima em mudança constante do que as populares, como a Pinot Noir, muito sensível à temperatura.
No ano passado, a onda de calor na Europa afetou até vinícolas, causando grandes prejuízos aos produtores.
A Counoise, por exemplo, é uma das 13 variedades permitidas nas misturas de Châteauneuf-du-Pape, no Vale do Rhône, na França. Os produtores a abandonaram no passado porque as uvas só amadurecem no fim da estação de crescimento. Portanto, nos anos mais frios, elas não amadurecem totalmente. E são suscetíveis a várias doenças.
Mas à medida que as temperaturas sobem, a Counoise está voltando. Sua característica de maturação tardia é agora uma vantagem. As uvas também mantêm alta acidez mesmo com ondas de calor e seca crescente.
“Nossa meta original de longo prazo sempre foi investir em todas as uvas cultivadas no Rhône, incluindo aquelas que praticamente desapareceram” diz Jason Haas, proprietário de segunda geração da Tablas Creek. “Agora, vemos que todas as variedades de maior acidez serão cada vez mais úteis à medida que o clima esquenta.”
Haas engarrafa versões 100% de 20 variedades diferentes, todas esgotadas. Ele diz que Counoise, Picpoul, Grenache Blanc e Vaccarèse são as variedades mais prováveis de dar bons vinhos sozinhas. A Grenache Blanc já é uma história de sucesso, tornando-se a segunda uva branca do Rhône mais plantada na Califórnia depois da Viognier.
O Vale do Rhône é apenas uma das muitas regiões vinícolas europeias que estão ficando ainda mais quentes. A ameaça da mudança climática está gerando um novo interesse em uvas abandonadas e incomuns também em Itália, Portugal e Espanha, entre outros, e está inspirando os vinicultores do novo mundo a cultivá-las.
Os produtores de vinho da Califórnia também estão entrando nessa tendência. Andy Smith, da vinícola DuMOL, em Russian River Valley, em Sonoma, no estado americano, arriscou com a Mencía, uma uva vermelha da região espanhola da Galícia.
“É uma variedade dura, de maturação tardia, resistente à seca. A uva perfeita para as mudanças climáticas”, conta Smith, que plantou pela primeira vez em 2016, colhe um mês depois do Pinot noir e está plantando mais. “O calor não afetou em nada as uvas.”
A Mencía também atrai os amantes do vinho que procuram algo novo. A primeira safra do tinto de frutas roxas e aroma floral de Smith – em 2018 – foi comprada pelo clube da vinícola em 48 horas. Agora, ele está estudando sobre a antiga variedade italiana Timorass.
Mas a tendência vai muito além dos Estados Unidos e da Europa, chegando à China e Austrália, onde o produtor Bruce Bassham descobriu que a uva Arinto portuguesa prospera mesmo em temperaturas de quase 48º Celsius.
E alguns enólogos simplesmente não conseguem resistir ao desafio do desconhecido. Como diz Matthew Rorick, de Forlorn Hope, de Napa: “Adoramos os planos gerais. Amamos os forasteiros, as causas perdidas.”